Os japoneses que evitam voltar para a casa depois do trabalho: “se chego cedo, a esposa reclama”

Imagem da esquerda: ie-men.jp / Imagem da direita: workit.vaio.com

Sasaki* é um japonês de 43 anos, que trabalha em uma empresa de manufatura e está casado há sete anos. Pai de duas crianças, de 5 e 7 anos, ele conta que perdeu o espaço dentro de sua própria casa.

Nos últimos anos, o governo do Japão passou a tomar medidas mais enérgicas contra o excesso de trabalho e muitos trabalhadores interromperam suas jornadas longas de horas extras.

A solução de um problema fez nascer outro na sociedade japonesa: os casos de trabalhadores que deixam as empresas cedo, mas não conseguem voltar para a casa.

Sasaki contou ao portal Nikkan SPA! que se sentiu deixado de lado por causa das reclamações da esposa e o estresse, principalmente após o nascimento de seus filhos.

“Eu comecei a chegar em casa mais cedo, no horário do banho e troca de roupa das crianças. Minha esposa não gostou, disse para eu não voltar para a casa naquele horário”.

Ele ouviu a reclamação da companheira e passou a beber com os colegas de trabalho e a voltar para a casa só depois das 10 horas da noite.

Por causa da pandemia e o isolamento social, Sasaki também começou a passar horas dentro do carro, no estacionamento de seu prédio, até se sentir confortável para entrar em casa.

Sasaki com a filha. Reprodução/Nikkan SPA!

“Minha esposa trabalha em casa com as crianças e seu comportamento ficou muito agressivo por causa do estresse. Outro dia tivemos uma briga feia e algo se partiu dentro de mim. Se continuar assim, vou acabar me divorciando”, lamentou.

PESQUISA

Não são poucos os casos como o de Sasaki, de maridos japoneses que evitam voltar para a casa quando a jornada de trabalho acaba sem horas extras.

O portal SPA! realizou uma pesquisa online com 3.048 trabalhadores casados no Japão e 16,4% afirmaram que não querem voltar para a casa quando o trabalho acaba.

A pesquisa perguntou para cerca de 500 homens que vivem esta realidade o que eles costumam fazer quando evitam voltar para a casa.

Cerca de 37% responderam que passam o tempo perto da empresa e 23,8% afirmaram que saem para dirigir ou ficam no carro. Cerca de 18% disseram passar o tempo em restaurantes e 13% esperam anoitecer nos “net cafés” (lan houses confortáveis do Japão).

Para 9,8% dos esntrevistados, a solução para o problema é simplesmente sentar no banco de um parque e ficar lá, esperando que fique tarde o suficiente para voltar para a casa.

Os homens também foram questionados se ajudam nas tarefas domésticas e nos cuidados com os filhos, já que parte do problema com as esposas se deve devido à sobrecarga que elas enfrentam.

Cerca de 61% dos entrevistados disseram que cuidam de afazares domésticos de forma completa ou “em algum nível”. Cerca de 39% confessaram que não fazem nada em casa ou que fazem muito pouco.

CORONAVÍRUS

Reprodução/Nikkan SPA!

O distanciamento social exigido pela pandemia do coronavírus agravou a situação desses homens, que ficam sem rumo ao terminar o trabalho cedo.

De acordo com o psicólogo social Shozo Shibuya, a pandemia fez surgir uma nova categoria de trabalhadores e maridos, que “se fecham em suas próprias conchas” para não ter que enfrentar seus problemas familiares.

“A necessidade de distanciamento social fez com que esses homens perdessem totalmente seus locais de pertencimento. Eles estão sofrendo uma pressão psicólogica que os obriga a se fechar como caracóis”, explicou.

*Nome fictício
*Siga a página Japão sem Tarjas para acompanhar as novas publicações.

Autor: Ana Paula Ramos

Jornalista e escritora, Ana tem sete anos de experiência no Japão, atuando como repórter na comunidade brasileira e como freelancer. Ela é a fundadora do Japão sem Tarjas e criadora do grupo ambiental "Por que você também não faz?". Em outubro de 2020, publicou o primeiro livro, "O Oitavo Andar", um suspense que se passa na cidade de Gramado. Em 2022 publicou o segundo livro, "O Diário da Minha Vida Ingrata", uma fantasia criada a partir de uma história real.

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