Salários altos e risco de morte por excesso de trabalho: a realidade de médicos no Japão

Reprodução/Gentosha Gold Online (imagem ilustrativa)

A falta de mão de obra já se tornou um problema comum em várias áreas profissionais no Japão, inclusive na medicina.

Com menos profissionais atuando em hospitais, os médicos se veem em uma situação de aumento de suas funções e responsabilidades. Isto gera estresse, horas extras prolongadas e riscos à saúde, devido ao excesso de trabalho.

De acordo com os dados da Federação de Medicina do Japão, 30% dos médicos que trabalham em hospitais fazem mais de 80 horas extras mensais, ultrapassando os limites para ser considerado excesso de trabalho.

O resultado disso é uma degradação física e psicológica, que pode resultar até mesmo em suicídio.

Segundo reportagem do portal Gentosha Gold Online, que abordou essa questão, as longas horas de trabalho também resultam em outro problema: o aumento do risco de erro médico.

O portal informou que a renda anual de um médico costuma ser muito superior a de um trabalhador comum de empresa japonesa, chegando a ¥15 milhões (cerca de R$ 785 mil).

No entanto, muitos médicos sequer podem aproveitar. Com uma rotina de trabalho excessiva, não sobra tempo para gastar dinheiro e ainda pagam impostos de renda e municipais elevados, que ultrapassam a faixa de ¥3 milhões no caso dos solteiros.

MULHERES NA MEDICINA

Photo by Bermix Studio on Unsplash (imagem ilustrativa)

As associações médicas já constataram que tem aumentado o interesse de mulheres jovens pelos cursos de medicina no Japão. No entanto, a maior presença feminina na profissão não é vista como algo capaz de mudar a realidade atual de escassez médica.

Em uma reunião do Comitê sobre Demanda Médica, realizada com membros do Ministério da Saúde no início do ano, o presidente da Associação Japonesa de Tratamento Médico (AJHC, em inglês), Shigeaki Kano, esclareceu o problema.

“Há mais mulheres manifestando o desejo de serem médicas, mas depois de formadas, muitas precisam se afastar por causa da maternidade. E quando voltam a trabalhar, enfrentam as dificuldades de conciliar a criação dos filhos com a profissão e acabam desistindo de trabalhar em tempo integral”.

Por causa da falta de suporte para que as mulheres japonesas construam uma carreira e criem os filhos ao mesmo tempo, muitas precisam optar entre o trabalho e a família.

Na medicina, esta realidade não é diferente.

Para não se afastar da profissão, é comum que muitas médicas passem a atuar meio período e dificlmente chegam perto de cumprir a carga horária dos colegas de profissão.

Com as médicas cumprindo jornadas de trabalho menores e muitos médicos já idosos, o país teme acabar sofrendo uma crise na medicina.

E para piorar a situação, o governo andou na contramão nas últimas décadas.

Em 1982, o governo japonês estimou que haveria um “excesso” de médicos atuando no país em 2007 e aprovou um plano que restringia as vagas para os cursos de medicina.

A situação em 2007 foi de falta de profissionais na área, o que fez com que mais vagas fossem abertas nos cursos de medicina a partir do ano de 2008. Isto gerou uma expectativa no governo de que o problema será solucionado no futuro.

No entanto, a estimativa das associações médicas não é nada otimista. Com o problema do excesso de trabalho, envelhecimento populacional, médicos idosos e outras questões, o problema não parece tão fácil de ser solucionado.

ÁREAS EM CRISE

Photo by Piron Guillaume on Unsplash (imagem ilustrativa)

O Ministério da Saúde está em processo de investigação para estimar o número de profissionais de medicina necessários nas províncias e avaliar a situação atual de escassez, considerando cidades de interior e clínicas.

No entanto, as associações médicas do país já se manifestaram, dizendo que é “notória” a falta generalizada de médicos nos hospitais do país.

Há algumas especialidades que também sofrem com a menor atuação de profissionais dessas áreas.

“A falta de médicos é maior no setor emergencial, pediatria e obstetrícia, áreas em que as condições de trabalho são piores. O governo precisa se apressar em fornecer diretrizes para a melhora do ambiente de trabalho”, disse Nakanobu Azuma, diretor da Clínica Tokatsu em Matsudo (Chiba), em uma coluna no Portal de orientações de carreira médica, MediGate.

Para Azuma, os problemas da profissão vão além da falta de profissionais. Os médicos acabam com responsabilidades em mãos que reduz a atenção que podem dar aos pacientes.

“Mesmo que aumente a quantidade de médicos nos hospitais, isso é apenas parte do problema. Perdemos muito tempo com atividades como prontuários digitais, orientação de novatos, verificações de segurança. Isto influencia nos tratamentos emergenciais e dos pacientes internados. Muitos médicos conduzem o tratamento sem mal olhar na cara do paciente”, constatou.

Outra questão, apontada por Kano na reunião ministerial, gira em torno da escassez de farmacêuticos atuando nos hospitais.

“É difícil até mesmo garantir profissionais que atuem meio período em hospitais. A questão pode ser a diferença salarial para os farmacêuticos em farmácias e hospitais. Gostaríamos que o governo considerasse a necessidade de garantir mais profissionais desta área nas instituições”, solicitou.

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Autor: Ana Paula Ramos

Jornalista e escritora, Ana tem sete anos de experiência no Japão, atuando como repórter na comunidade brasileira e como freelancer. Ela é a fundadora do Japão sem Tarjas e criadora do grupo ambiental "Por que você também não faz?". Em outubro de 2020, publicou o primeiro livro, "O Oitavo Andar", um suspense que se passa na cidade de Gramado. Em 2022 publicou o segundo livro, "O Diário da Minha Vida Ingrata", uma fantasia criada a partir de uma história real.

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