Família de estrangeira que morreu em Centro de Imigração está no Japão e busca respostas

A cingalesa Wishma Sandamali morreu aos 33 anos, durante a detenção no Centro de Imigração de Nagoya. As autoridades ignoraram laudo médico que recomendava medicação ou terapia intravenosa no hospital.

Velório de Wishma Sandamali gerou comoção e o caso ganhou a atenção da mídia japonesa. Fotos: Jornal Mainichi.

Wishma Sandamali tinha apenas 33 anos quando deu seu último suspiro no Centro de Detenção da Imigração de Nagoya, na província de Aichi, em março deste ano.

Ela estava detida desde agosto do ano passado por causa de overstay (quando o visto vence e o cidadão continua no país). A cingalesa começou a apresentar problemas de saúde em janeiro deste ano, com vômitos frequentes, perda de apetite e de peso.

Wishma perdeu cerca de 20 quilos e estava com dificuldades para caminhar. Depois dos exames, foi diagnosticada com a doença do refluxo gastroesofágico. Ela poderia ter se recuperado se tivesse recebido liberdade provisória e se tivesse sido internada para terapia intravenosa, mas não foi o que aconteceu.

Segundo reportagens dos jornais Asahi (veja aqui) e Mainichi (veja aqui), as irmãs mais novas de Wishma, Wayomi (28) e Poormina (26) estão no Japão e buscam por respostas.

Comoção no funeral

As irmãs chegaram no Japão no início de maio, mas ficaram duas semanas em um hotel cumprindo a quarentena obrigatória. No domingo (16), o funeral de Wishma foi realizado em Nagoya reuniu cerca de 100 pessoas, entre os familiares e envolvidos com o caso.

Segundo o Jornal Mainichi (veja aqui), as irmãs viram o corpo de Wishma pela manhã e ficaram muito comovidas. “Não parecia a nossa irmã”. O funeral foi realizado com os rituais budistas do Sri Lanka e Wayomi representou a família.

“Somos muito gratas pelo apoio e a participação no funeral da minha irmã mais velha. Nossa mãe infelizmente não pode vir e desde que o pai morreu, a Wishma foi um apoio para nós. Não consigo acreditar que a minhã irmã morreu tão jovem, aos 33 anos”.

Mesmo depois de dois meses da morte de Wishma, muitos detalhes ainda não foram esclarecidos e as irmãs cobram por respostas.

“Minha irmã morreu no país que ela gostava tanto. Não consigo suportar a tristeza”, disse Wayomi.

Vida no Sri Lanka

Wishma com a família no Sri Lanka, dias antes de embarcar ao Japão. Foto publicada pelo Jornal Asahi.

As irmãs de Wishma deram uma entrevista ao Jornal Asahi e contaram um pouco sobre a vida em família. As três irmãs cresceram juntas e eram muito próximas. Quando o pai delas morreu, há 9 anos, Wishma ainda estava na universidade e Wayomi e Poormina tinham menos de 20 anos.

Enquanto estudava na faculdade, Wishma dava aulas de inglês em uma escola internacional e ajudava nas finanças da família e nas atividades domésticas. Ela cuidava das irmãs mais novas como se fosse uma mãe.

As vezes dava aula de inglês para crianças pobres da comunidade.

“Ela queria entender a situação que outras pessoas enfrentavam para poder ajudá-las”, disse Wayomi.

Wishma assistiu a novela “Oshin” da emissora NHK e se familiarizou com a cultura japonesa. Pelo interesse no Japão e por achar que é um país seguro, decidiu vir para estudar.

“Em 2017, a família ficou muito entusiasmada quando soube que a Wishma iria ao Japão para estudar. Dois dias antes da viagem, tiramos uma foto em família”, as irmãs disseram.

Depois de saber da morte da filha, a mãe delas ficou doente. 

“A nossa mãe adoeceu e ficou perguntando por que as autoridades de imigração mataram a nossa irmã”, Wayomi comentou.

Em busca de respostas

Centro de Imigração de Nagoya, onde a cingalesa estava detida por “overstay”. Foto: Jornal Mainichi.

Tudo indica que o caso de Wishma foi de negligência por parte do Centro de Imigração, o local onde os estrangeiros sem autorização de residência podem ser detidos até que deixem o país, por conta própria ou sob ordem de deportação.

O histórico médico de Wishma e o laudo referente a uma endoscopia e consulta que ela realizou no dia 5 de fevereiro foi obtido antes mesmo de o relatório sobre o óbito ser divulgado. O laudo apontava para um quadro de refluxo e hemorragia pela frequência diária dos vômitos.

Ela deveria ser medicada e se não fosse possível administrar os remédios, deveria ser internada para receber terapia intravenosa.

O Escritório Regional de Serviços de Imigração de Nagoya foi questionado pelo Ministério da Justiça sobre o óbito e emitiu o relatório que falava sobre a consulta médica realizada naquele dia. O documento negava que houve recomendação médica para internação.

Diante da piora da condição de saúde, Wishma pediu para receber a liberdade provisória e ser internada em um hospital, mas as autoridades não concederam o recurso. Dias depois, o estado de saúde piorou e ela veio a óbito no dia 6 de março.

Nesta segunda-feira (17), as irmãs devem visitar o Centro de Imigração de Nagoya para obter explicações e irão participar de uma coletiva de imprensa depois da visita. Elas estão com um advogado cuidando do caso da irmã.

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Autor: Ana Paula Ramos

Jornalista e escritora, Ana tem sete anos de experiência no Japão, atuando como repórter na comunidade brasileira e como freelancer. Ela é a fundadora do Japão sem Tarjas e criadora do grupo ambiental "Por que você também não faz?". Em outubro de 2020, publicou o primeiro livro, "O Oitavo Andar", um suspense que se passa na cidade de Gramado. Em 2022 publicou o segundo livro, "O Diário da Minha Vida Ingrata", uma fantasia criada a partir de uma história real.

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