A realidade dos japoneses que preferem viver na rua a pedir auxílio do governo

Akihiro Nakano, da NPO Hot Plus (esquerda) ー Divulgação/Hot Pluss

Em tempos de pandemia e crise, muitas pessoas perderam a segurança de seus empregos fixos e a estabilidade econômica. No Japão, essa realidade não foi diferente.

Para a organização sem fins lucrativos (NPO) Hot Plus, que atua na província de Saitama e atende pessoas em dificuldade financeira, neste momento atual de crise, qualquer cidadão pode perder tudo, inclusive sua moradia.

O que tem sido um desafio para a entidade, no entanto, é convencer muitos japoneses de que devem pedir o auxílio social do governo (seikatsu hogo) e não deixar que a vergonha ou o orgulho os impeça.

Este auxílio do governo japonês oferece uma renda mínima para quem não tem condições de trabalhar por algum motivo.

É um sistema no estilo “bolsa família”, que possui várias condições aos interessados, sendo que não é permitido, por exemplo, ter um carro, por ser um bem de valor.

Akihiro Takano, que realiza consultas através da Instituição, deu uma entrevista ao Portal Nikkan SPA! e contou sobre a dificuldade, principalmente de homens de meia idade no Japão, em contar com o auxílio do governo em um momento de extrema necessidade.

Takano, que tem 61 anos, passou a oferecer consultas depois de passar por uma experiência parecida.

Ele vivia com um salário alto como gerente de uma loja de departamento, mas sua vida mudou por causa de doenças de seus pais, despesas médicas e funerárias.

O pai foi diagnosticado com câncer e depois de tentar a ajuda de vários sistemas públicos, acabou decidindo largar o emprego para cuidar dele.

Takano chegou a juntar mais de ¥20 milhões com poupança de aposentadoria e suas economias de trabalho. Duas semanas depois de deixar o bom emprego que tinha, o pai faleceu.

A mãe foi diagnosticada com demência tempos depois e ele acabou gastando as economias com tratamentos caros, serviços de cuidados especiais com idosos e, mais tarde, com o funeral dela.

Por fim, acabou sem emprego e sem dinheiro e foi morar na rua. Ele passou a dormir em parques, até que foi resgatado por uma instituição e deu entrada no auxílio do governo.

Três anos depois, conseguiu emprego em um centro de suporte e passou a oferecer consultas às pessoas em situações parecidas. Hoje, tenta convencer desempregados japoneses de que não é vergonhoso contar com o auxílio do governo.

SITUAÇÃO DIFÍCIL

Photo by Ben Hershey on Unsplash

Takano diz que, por causa da pandemia, as consultas de pessoas em dificuldades financeiras aumentaram durante o mês de abril.

“Em meados de abril, muitas pessoas que tinham empregos instáveis procuraram o serviço de consultas por estar em uma condição que não poderiam mais se manter. No fim do mês, passamos a receber consultas de pessoas que trabalhavam como funcionários efetivos”

De fato, houve muitas demissões neste período. No fim de abril, uma empresa de Táxi em Chiba demitiu todos seus funcionários efetivos e a crise começou a afetar também quem contava com o conforto de um emprego estável.

Quando não há mais renda ou suporte familiar e o trabalhador não consegue se encaixar novamente no mercado, o auxílio social se torna a última opção para manter o mínimo necessário para não ter que viver nas ruas.

Porém, para muitos japoneses que antes contavam com a renda de seus empregos, é difícil aceitar essa opção.

“Isto é uma característica muito comum em homens de meia idade. Eles possuem resistência ao auxílio do governo, acham vergonhoso e não querem contar com essa ajuda”, diz Nakano.

Como consultor, ele tenta convencer essas pessoas de que a situação é emergencial e o auxílio pode mudar a realidade delas, garantir que tenham estrutura para se reerguerem na vida.

“Estamos vivendo um momento delicado e até a pandemia passar e a situação se acalmar, é importante contar com essa ajuda que podemos solicitar nas prefeituras”, concluiu.

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Autor: Ana Paula Ramos

Jornalista e escritora, Ana tem sete anos de experiência no Japão, atuando como repórter na comunidade brasileira e como freelancer. Ela é a fundadora do Japão sem Tarjas e criadora do grupo ambiental "Por que você também não faz?". Em outubro de 2020, publicou o primeiro livro, "O Oitavo Andar", um suspense que se passa na cidade de Gramado. Em 2022 publicou o segundo livro, "O Diário da Minha Vida Ingrata", uma fantasia criada a partir de uma história real.

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